terça-feira, 21 de junho de 2011

Uma Kriek do Fundão

Cerveja: Sol
Cervejeira: Cervecería Cuauhtémoc Moctezuma, Monterrey, México



Uma base de cerveja mexicana escrita em alemão. Nada de estranho num mundo onde cada vez mais as distâncias se esbatem. Mas será esta uma relação circunstancial entre a Sol e a Alemanha?

Na realidade, a Sol deve o seu nome a um cervejeiro alemão. Corria o ano de 1899 e o jovem mestre da Fábrica de Cerveza El Salto del Agua observava a preparação de uma sua nova criação quando o Astro-Rei se reflectiu de uma forma particular no tanque de brassagem trazendo consigo a inspiração para o nome da nova cerveja: El Sol. Se trata-se de uma lenda ou não, o que é certo é que a El Salto del Agua foi comprada pela Cervecería Moctezuma em 1912. A El Sol, passados 12 anos sobre a aquisição, deixou cair o artigo do nome, ficando a cerveja do mestre alemão conhecida, até hoje, simplesmente por Sol.

Desde então, a Sol não passou de uma cerveja com distribuição restrita à sua região de origem. As coisas iriam, no entanto, dar uma reviravolta. O mercado da cerveja no México concentrava-se e a Cervecería Cuauhtémoc foi uma das forças por detrás de uma bipolarização que ainda hoje por lá se sente. Para isso contribuíram as aquisições da Cervecería de Tecate em 1954 e da Cervecería Moctezuma em 1985. Com o alargamento do portfólio de marcas, a Sol foi então relançada, em 1993, desta feita a nível nacional. O sucesso, sobretudo junto dos estrangeiros nas zonas mais turísticas, foi tal que a cerveja começou a ser distribuída a nível mundial, tornando-se hoje, para o bem e para o mal, juntamente com a arqui-rival Corona, sinónimo de cerveja mexicana.

A questão é: existe uma cerveja mexicana? Um estilo tão marcado que obriga a meter uma lima no gargalo e a beber pela garrafa? Claro que não. Tal como tive oportunidade de aqui comentar, hoje em dia não existem limitações para fazer qualquer estilo em qualquer local. A Sol não passa de uma cerveja que graças a uma grande capacidade de promoção e marketing é um sucesso, mas não deixa de ser igual a tantas outras que, sem sabor, são produzidas por esse mundo fora, no México ou em Portugal.

Não deixa de ser curiosa esta reflexão já que é completamente contrastante com aquilo que acontece noutra bebida fermentada bem conhecida de todos, o vinho. Aqui, independentemente de se usarem castas de uva iguais em várias partes do mundo, o terroir, é rei e senhor. O solo, a chuva, o Sol, a topografia, definem um vinho. Um Cabernet Sauvignon, feito pelo mesmo enólogo em Portugal, França, Austrália, Chile ou Califórnia, nunca será o mesmo vinho. Já com uma cerveja não há diferenças entre fazer uma cerveja com malte da Weyermann, lúpulo da Charles Faram e levedura da Wyeast, em Lisboa, Madrid ou no Rio de Janeiro.

Há no entanto um ponto em que podemos encontrar alguma semelhança entre os dois mundos, as produções monovarietais. Nalguns casos já existiam há muitos anos por força da tradição, mas nos últimos tempos temos vindo a verificar um aumento significativo de rótulos de vinhos produzidos com uma única casta. Como consumidor acho-os vinhos interessantes dado permitirem dar a conhecer melhor o perfil de cada casta e perceber as diferenças entre cada casta no mesmo terroir.

Na cerveja, a febre do monovarietal é relativamente nova mas já tem inúmeros adeptos. Tendo em conta os vários ingredientes que são utilizados no seu fabrico há espaço para vários tipos de abordagem em relação ao que é monovarietal, mas a escolha recai invariavelmente no lúpulo, elemento com grande capacidade de aroma e sabor e bastante acarinhado pelos cervejeiros artesanais. O princípio é sempre o mesmo. Pega-se numa cerveja base e altera-se apenas o lúpulo a ser usado na ebulição e no dry-hopping. Alguns exemplos célebres são as séries:
 
  • BrewDog IPA is Dead (Bramling Cross, Citra, Nelson Sauvin e Sorachi Ace)
  • The Kernel Pale Ale (Amarillo, Cascade, Centennial, Chinook, Citra, Columbus, Mt. Hood, Nelson Sauvin, Nugget, Pacific Cascade, Simcoe e Warrior)
  • Mikkeller Single Hop IPA (Amarillo, Cascade, Centennial, Chinook, East Kent Golding, Nelson Sauvin, Nugget, Simcoe, Tomahawk e Warrior)
  • Mikkeller Hop Series (Amarillo, Bravo, Cascade, Centennial, Challenger, Citra, Cluster, Columbus, Galena, Magnum, Mt. Hood, Nugget, Palisade, Simcoe, Sorachi Ace, Super Galena, Tettnanger, Warrior e Willamette)
  • Samuel Adams Latitude 48 Deconstructed IPA (Ahtanum, East Kent Goldings, Hallertau Mittelfrueh, Simcoe e Zeus)

Outras séries que motivam interesse são a Mikkeller Yeast Series onde são utilizadas várias leveduras (American-style, Belgian Ale, Brettanomyces, Hefeweizen, Lager e US Ale) para fermentar a mesma cerveja base e a Revelation Cat Woodwork Series onde podemos comparar cervejas que estagiaram em barris de Carvalho Francês, Carvalho Americano e Acácia com a cerveja base que não passou pela madeira.

Aguardo pacientemente por cervejas monovarietais de malte, água ou variedades de cerejas.

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